Marketing: A Apple à sombra de Jobs

Janeiro 24, 2011 by  
Filed under Notícias

Falta de um plano claro de sucessão e comunicados lacônicos sobre a saúde de seu fundador colocam em dúvida o futuro da empresa de tecnologia mais valiosa do mundo.

Lembrar que todos estaremos mortos logo foi a melhor ferramenta que encontrei para me ajudar a fazer as grandes escolhas da vida”, disse Steve Jobs, o fundador da Apple, a empresa de tecnologia mais valiosa do mundo, em discurso aos formandos da Universidade Stanford, em 2005.

Cerca de um ano antes, ele havia descoberto ter contraído um câncer no pâncreas. Mas, apesar de inevitável, a perspectiva de que Jobs, o filho adotado de uma família californiana, morra algum dia traz dissabor aos investidores da Apple.

Na segunda-feira 17, esse temor voltou a ser uma sombra incômoda a pairar sobre a fabricante americana de computadores, telefones móveis e entretenimento digital. Em um comunicado dirigido aos funcionários da Apple, Jobs informou que entraria em sua terceira licença médica desde 2004.

O texto não especificava uma data para sua volta à gestão da empresa ou a gravidade do problema de saúde, limitando-se a pedir respeito à sua privacidade e à de sua família.

Foi o suficiente para que as ações da Apple sentissem o golpe, ainda que de forma menos dramática do que o previsto por muitos analistas. Na terça-feira 18, elas chegaram a cair 6,5% na Nasdaq, bolsa eletrônica dos EUA, mas fecharam o pregão em uma queda de 2,3%.

Contribuiu para deter a queda, a divulgação dos resultados do último trimestre fiscal de 2010, que registrou um lucro de US$ 6 bilhões, um crescimento de 78% sobre o mesmo período do ano anterior.

O afastamento do visionário fundador da Apple colocou em discussão a importância da divulgação ao mercado de um plano de sucessão claro por parte de empresas com a imagem muito ligada a um alto executivo ou fundador.

Esse é o caso da Apple. Jobs é considerado um mago da inovação. Os principais produtos da companhia que ele fundou em uma garagem na pequena cidade americana de Cupertino, no Estado da Califórnia, em 1976, têm o seu toque mágico: do computador Macintosh, ao tocador de música digital iPod, o telefone celular iPhone e o tablet iPad, sua mais recente criação.
Tudo passa pelo seu crivo.

Diante do seu afastamento, sem uma data precisa para o retorno, o mercado se pergunta: qual é o futuro da Apple? “Algumas marcas criam uma simbiose tão grande com um executivo ou com o fundador que surge a dúvida de que possam evoluir sem ela”, afirma Júlio Moreira, sócio da consultoria de marcas TopBrands. “Gosto da característica humana disso, mas o problema é o dia seguinte.”

Por esse motivo, não é de se estranhar que, no texto em que informa sobre sua licença médica, Jobs diz que mantém o cargo de CEO da Apple, afirmando textualmente que vai continuar “envolvido nas principais decisões estratégicas da companhia”.

Durante seu afastamento, quem vai comandar o dia a dia da Apple é o executivo-chefe de operações, Tim Cook, que já assumiu o leme nas duas vezes em que Jobs se afastou anteriormente.

“Cook é um executivo capaz, que pode lidar com a pressão”, diz um relatório do banco de investimento Barclays, divulgado na semana passada. “Ele sabe conduzir os trabalhos internos da Apple à sombra de Steve.” No entanto, Cook está longe de ter o carisma e a liderança de Jobs. Um olhar para o passado da Apple, pode explicar os temores dos investidores.

Na metade da década de 1980, Jobs fora afastado da empresa que ajudou a fundar, derrotado na luta pelo poder com o executivo John Sculley, que recrutara na Pepsico para dirigir a Apple.

Ele retornou à companhia em 1997. Nesse ano, a Apple estava à beira da falência. Seus produtos não tinham mais a aura de inovação, nem o design sofisticado. A ação de Jobs foi decisiva para retirar a Apple do abismo.

Ele cortou custos, eliminou linhas de produtos e voltou a criar objetos cobiçados e desejados pelos consumidores. Um exemplo disso foi o lançamento do iMac, computador que marca o ressurgimento da companhia em 1998.

Depois disso, vieram o iPod (2001), iPhone (2007) e o iPad (2009), produtos que colocaram a Apple na vanguarda do setor de tecnologia. O resultado pode ser medido pela valorização das ações da empresa.

Em 19 de janeiro de 2001, elas valiam US$ 9,75. Na quarta-feira 18, US$ 340,65. Com esse aumento astronômico, a Apple ultrapassou a Microsoft, de Bill Gates, em valor de mercado. Atualmente, é a segunda companhia mais valiosa do mundo, atrás apenas da petrolífera Exxon Mobil, cujo valor de mercado é de US$ 392,5 bilhões.

Embora seja o grande artífice da estratégia que levou a Apple a deixar na poeira a Microsoft, Jobs tem muito a aprender com Bill Gates, quando se trata de transição na gestão (leia quadro ao lado).

Nos últimos anos, Gates pôde se dedicar em tempo integral à filantropia, porque soube preparar um Steve Ballmer para sucedê-lo. A Apple, é certo, sinalizou ao mercado que possui um plano de sucessão, mas que não tem interesse em detalhá-lo, o que só faz aumentar as especulações .

“Os planos de sucessão devem ser comunicados, com sua política e estrutura, mas sem entregar o mapa da mina”, diz o presidente do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), Gilberto Mifano.

Um dos motivos para o segredo quanto ao real estado de saúde de Jobs, e dos planos de sucessão, é o temor de avanços da concorrência. O próprio Cook teria sido sondado pelas fabricantes Motorola e Dell para deixar a Apple.

Outra razão seria o receio de Jobs em criar sucessores fortes, após o trauma de ter sido demitido da empresa que fundou por Sculley. “O sucesso da transição se traduzirá na capacidade de a Apple continuar entregando inovações”, diz a diretora da área de estratégias da Interbrands, Daniella Bianchi.

Nas vezes anteriores em que Jobs saiu por motivos de saúde, o susto inicial no mercado foi seguido por mais crescimento do valor das ações. A dúvida é se isso continuará acontecendo com a ausência definitiva de Jobs do desenvolvimento dos desejados produtos com a marca da maçã.



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