Inovação: Os negócios onde Braga é líder e marca golos

Abril 2, 2012 by  
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Aviso prévio: estamos em Braga para falar de negócios, mas o futebol é inevitável. Corrigimos: mais do que inevitável, é o ponto de partida. Não há melhor desbloqueador de conversa em Braga.

Mas estamos mesmo a falar de futebol? “Não, tem tudo que ver com gestão e competência. Falo muitas vezes do Braga como um bom case study dos recursos humanos. Com uma equipa de gestão mínima e gastando menos do que a concorrência, o clube tem sucesso. Mas não me revejo na sua gestão centralizada”, diz Pedro Tinoco Fraga, CEO e fundador da F3M, que fatura 5,7 milhões de euros e foi pioneira nos softwares de gestão.

Nas salas das maiores empresas da cidade, no gabinete do vice-reitor da Universidade do Minho ou no estúdio dos Mão Morta, voltamos sempre ao ponto de partida: o exemplo do Sporting de Braga. À sombra do sucesso do clube, esconde-se o líder, que evita dar entrevistas e impôs a lei da rolha aos dirigentes.

 “O Braga é a imagem da direção. O presidente António Salvador e restante direção eram empresários de sucesso [António Salvador é presidente e dono da Britalar, empresa que começou na construção civil e se expandiu para o imobiliário, turismo e saúde]. Mudaram o clube. Compartimentaram a estrutura. Antes, um dirigente fazia quase tudo, agora está tudo definido, cada um tem a sua função”, explica Miguel Pedro, que acumula o cargo de diretor municipal com o de baterista dos Mão Morta e o de presidente da Assembleia Geral da SAD do Sporting de Braga, sendo coautor dos estatutos.

O insucesso de alguns adversários também ilustra as qualidades do presidente. “O anterior treinador era um líder fraco. Mas tinha uma liderança forte acima dele que supria essa lacuna. No Sporting não e por isso o mesmo treinador não se deu bem. Tem tudo que ver com os recursos humanos”, insiste Pedro Tinoco Fraga. Além das competências nos recursos humanos, António Salvador é um gestor rigoroso, garante Miguel Pedro: “Na última época, tivemos receitas de 35 milhões de euros e abatemos 80% do passivo.”

Segundo o relatório e contas de 2010-2011, a SAD do clube reduziu o passivo bancário de 16 618 614€ para 3 264 885€ e apresentou um saldo positivo de 5,2 milhões de euros, que lhe valeu o prémio da UEFA Best Sporting Progress 2011. Entre dívidas à banca, a terceiros, ao Estado e diferimentos, fechou o ano com um passivo de 14 milhões de euros, contra 19 milhões de ativos. Resumindo: com tantos elogios, ser de Braga e não apoiar o clube da cidade é quase um insulto.

 “No meu tempo, era o único sócio do Braga na escola. Hoje, os miúdos são todos do Braga e vão para as escolas com camisolas do clube”, diz Miguel Pedro.

Os principais adversários da cidade estão em Lisboa e no Porto. E agora – ao telefone com Hugo Pires, conhecido como supervereador por acumular oito pelouros na autarquia – não estamos a falar de futebol: “Mas nós somos melhores. Somos uma cidade mais atrativa do que Lisboa e Porto. Existem oportunidades de emprego e muito dinamismo empresarial.” Uma dinâmica com mais expressão num sector específico. A Roma portuguesa mudou o rótulo para Silicon Valley portuguesa quando começaram a surgir várias empresas ligadas à tecnologia e software informático.

 A F3M foi das primeiras. Começou em 1987 com quatro sócios, hoje emprega 115 pessoas a ganhar uma média de 1500 euros ilíquidos, tem 6000 clientes e está em nove países. A Primavera apareceu no início dos anos 1990 com o espírito de empresa de garagem: dois sócios fundadores que no primeiro ano eram pau para toda a obra e faturaram 100 mil euros com o Contalip, um software de contabilidade. Quase 20 anos depois, são 220 e faturam 14 milhões de euros (38% no mercado externo). Pedro Tinoco Fraga, sócio-fundador da F3M, e José Dionísio, sócio-fundador da Primavera, fizeram percursos semelhantes. O primeiro veio de Seia, o segundo de Portimão. Os dois licenciaram-se em Engenharia de Sistemas de Informação na Universidade do Minho. Os dois conheceram no curso os seus sócios.

Os dois fixaram-se em Braga. Os dois concordam não ser caso único na cidade e que a universidade é o grande motor deste empreendedorismo da indústria tecnológica bracarense.
A Universidade do Minho tem cerca de 18 mil estudantes (12 mil no polo de Braga, seis mil em Guimarães), 1200 docentes e 600 funcionários.

 Segundo dados oficiais da instituição, já saíram do seu ecossistema 113 empresas, que criaram 2200 postos de trabalho, com um volume de negócios somado de 360 milhões de euros. A explicação do vice-reitor José Mendes: “Somos a universidade com mais patentes licenciadas. Existe aqui uma cultura de devolver valor à sociedade e de converter o conhecimento em dinheiro. Até porque 55% do nosso orçamento [110 a 120 milhões de euros] vem do Estado, mas 45% são receitas próprias, provenientes das propinas, investigação e consultadoria.”

Como bandeira, a história da Mobicomp é acenada várias vezes na cidade: “É o caso mais paradigmático. Os fundadores eram um recém-licenciado [Carlos Oliveira, atual secretário de Estado do Empreendedorismo, Competitividade e Inovação], um aluno [António Murta] e um docente [Gastão Taveira].” A Mobicomp foi criada em 2000 com um investimento de 5000 euros. Oito anos depois, a Microsoft, atraída por um software para proteção de dados dos telemóveis, comprou-a por 28 milhões de euros.

Marco Leal, engenheiro de sistemas de informação, entrou para a equipa de desenvolvimento em 2000, acompanhou a transição para a Microsoft e chegou a trabalhar na sede do gigante americano, em Redmond, Washington: “Foi interessantíssimo, aprendi imenso. Por outro lado, empresas daquela dimensão não têm grande amplitude. O processo de implementação de uma ideia não é ágil, ao contrário de uma start-up.”

 No ano passado, saiu da Microsoft e fundou a iMobileMagic, que cria aplicações para telemóveis e funciona no edifício Ideia Atlântico, onde têm sede cerca de 70 start-up.

“Durante muitos anos, éramos a capital do software. Hoje temos projetos na área das biotecnologias, nanotecnologias.…A abrangência é maior. Braga é um polo tecnológico fortíssimo”, diz Pedro Tinoco Fraga.

Exemplos? O Laboratório de Nanotecnologia, um protocolo entre o Governo português e espanhol que estabeleceu na cidade um centro ibérico de investigação; a pioneira investigação sobre o stress liderada por Nuno Sousa, que foi publicada na revista Science; a atribuição a cientistas da Universidade do Minho do Grande Prémio BES Inovação nos dois últimos anos do concurso; empresas como a Sketchpixel, que produz conteúdos de animação para anúncios em todo o mundo e fez a produção 3D de uma série de animação infantil da Marvel; ou a Edigma, que se especializou em sistemas interativos multitoque, ganhou o prémio Inovação da Exame Informática em 2010 e vendeu um globo tátil para o iate de Roman Abramovich.

Mas há mais, garante José Mendes: “Temos um tecido empresarial poderoso. É aqui, na fábrica da Bosch, que se produzem os autorrádios para toda a Europa. E também temos a fábrica da Continental.”
Deixando as tecnologias, passamos a bola à música, cuja intensa produção marcou a cidade nos anos 80 e volta a estar em destaque. Em parte porque a autarquia recuperou nove salas nas bancadas do Estádio 1.o de Maio e transformou-as em estúdios insonorizados que aluga por 25 euros ao mês.

 “É quase dado. Tenho amigos que para ensaiar em Lisboa pagam 300 euros cada um por sala. Isto permitiu-nos ensaiar de forma contínua e gerou colaborações entre bandas”, conta Luís Fernandes, dos Peixe:Avião, um dos vários projetos que crescem no antigo estádio do Sporting de Braga.

Ao todo, estão ali cerca de 70 músicos, dos eternos Mão Morta aos Mundo Cão (com o ator Pedro Laginha), Governo (que junta Valter Hugo Mãe aos Mão Morta), Peixe:Avião e os mais recentes Smix Smox Smux, Estilhaços ou Long Way to Alaska.

Além de todos os rótulos que lhe vão colando (Roma, Silicon Valley, Manchester, capital do software), Braga orgulha-se de ter uma das populações mais jovens da Europa: “Num total de 182 mil pessoas, 80 mil têm menos de 35 anos”, avança Joel Pereira, administrador da Fundação Bracara Augusta, que gere a Capital Europeia da Juventude.

O que falta então a Braga? José Mendes, autor do livro O Futuro das Cidades, responde: “Existem condições para nos afirmarmos e chegar ao nível do Porto. É necessário um esforço para chegar aos 200 mil habitantes, o limiar da relevância internacional e liderança estratégica, mais virada para os fatores de diferenciação.”

 José Dionísio acrescenta: “Falta uma estratégia de captação de empresas.” Hugo Pires garante que a estratégia autárquica está definida e o objetivo é “fixar quadros, pessoas, conhecimento e ter sinergias com a universidade”.

 Aos 32 anos, o super- vereador já foi apontado como possível sucessor de Mesquita Machado, que é presidente desde 1976. Será? “Estou disponível.”

Fonte: Dinheiro Vivo



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