Marketing: Cultura vale mais que indústria têxtil portuguesa

Abril 4, 2013 by  
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Estado português gasta menos do que os seus parceiros europeus com Cultura. No entanto, o sector tem um peso significativo na economia nacional. Estimativas de um estudo publicado em 2010 apontam para o equivalente a 2,8% de toda a riqueza criada em Portugal

Guimarães 2012 – Capital Europeia da Cultura atraiu dois milhões de visitantes.

“A arte mão tem nada a ver com as preocupações sisudas do economista […] Não só os dois mundos não se encontram como não existe ressentimento em relação a isso.” A análise de John Kenneth Galbraith tem mais de 50 anos, mas continua no centro da discussão contemporânea em torno da Cultura, sobre quanto estamos dispostos a gastar com ela e qual o seu impacto no crescimento económico.

Quanto vale um euro investido em Cultura? A discussão está longe de ser recente. Em Portugal, aquele que é visto como o primeiro grande estudo sobre esse impacto foi realizado em 1988 para o governo de Cavaco Silva por… Vítor Gaspar e Luís Morais Sarmento. Como o Negócios lembrou este mês, os actuais ministro das Finanças e secretário de Estado do Orçamento concluíam que a despesa dos portugueses com cultura tinha um peso de 3% do PIB. O estudo antecipava que a sua dimensão continuasse a subir até representar 5% da riqueza nacional, podendo ultrapassar o ritmo de crescimento da despesa total das famílias.

Ou seja, há pelo menos 25 anos que os responsáveis políticos conhecem o impacto do sector na economia. Recentemente ficámos a saber mais. Em 2010, Augusto Mateus, antigo ministro da Economia, publica um relatório que aponta que o “sector cultural e criativo originou, no ano de 2006, um valor acrescentado bruto (VAB) de 3.691 milhões de euros, empregando cerca de 127 mil pessoas, isto é, foi responsável por 2,6% do emprego e por 2,8% da riqueza criada em Portugal”. No mesmo ano, a indústria têxtil e de vestuário tinha gerado 1,9% do VAB português. Alimentação e bebidas? “Apenas” 2,2%. Entre 2000 e 2006, o emprego total cresceu 0,4%, enquanto nos sectores ligados à Cultura a variação foi 4,5%. Cinco ano depois, o INE calcula que as famílias portuguesas gastavam em 2011 uma média de 1.073 euros em “lazer, distracção e cultura”, equivalente a 5,3% dos gastos totais dos agregados familiares.

Não se pode dizer que os sucessivos governos tenham sido muito sensíveis a estas avaliações. O Estado português gasta pouco com Cultura e tem despendido cada vez menos, desde 2009. A verba inscrita no orçamento para o programa de Cultura é equivalente a 0,1% do PIB – um valor inferior à média da Zona Euro. As razões não estão apenas relacionadas com falta de vontade política. Os programas de austeridade e a aplicação da dieta da troika têm-se feito sentir, com cortes transversais na despesa que afectam todas as áreas. Há quatro anos, o Estado gastava 0,4% com Cultura, um valor que até estava a crescer desde 2000.

Os poderes políticos apoiam as indústrias da cultura por estas representarem não só um complemento ao aparelho educacional, mas também por a Cultura se assumir como uma instância de integração social e de reforço da identidade cultura.

Deve a cultura ser subsidiada?
Além disso, alguns especialistas defendem que subsidiar a Cultura pode beneficiar quem já tem um poder económico mais elevado. Muitas vezes, aumentar a qualidade cultural depende da contratação de melhores artistas, o que se traduz num aumento de preço. É aqui que oEstado ou mecenas poderiam entrar, através de apoios. Porém, os subsídios e preços mais baixos não garantem, por si só, um alargamento do público. Ou seja, os subsídios podem acabar dirigidos a quem tem mais poder económico.

EmílioRuiVilar recusa este argumento. Em 2007, o ex-presidente da FundaçãoCalouste Gulbenkian escrevia que “as razões para a política de apoio não se encontram fundamentalmente dentro da indústria propriamente dita, mas sim no seu exterior”. “Os poderes políticos apoiam as indústrias da cultura por estas representarem não só um complemento ao aparelho educacional, mas também por a Cultura se assumir como uma instância de integração social e de reforço da identidade cultural”.

Uma ideia que o próprio governador do Banco de Portugal parecia reconhecer há pouco mais de um mês. “A Cultura é neste momento uma das minhas maiores preocupações do ponto de vista do modelo de desenvolvimento económico do País”, afirmava Carlos Costa. Mesmo alguns dos que defendem uma intervenção limitada do Estado consideram o actual nível de despesa muito baixo. “A minha concepção de Estado é que, tirando algumas funções essenciais, deve ter um papel suplementar. Na Cultura, aplicar esta lógica de forma cega é perigoso”, explicava no final do ano passado o escritor Pedro Mexia, em declarações ao Negócios. “Este orçamento da Cultura é ridículo. Em Portugal, sem Estado não há biodiversidade cultural.”

Portugueses pouco virados para a cultura
Ao mesmo tempo, os portugueses apresentam níveis e participação cultural muito baixos, face ao resto da Europa. Um inquérito do Eurostat feito em 2007 mostra que Portugal apresentava a percentagem mais alta de pessoas que não tinham lido um único livro nos últimos 12 meses e a segunda maior de pessoas que não folhearam um jornal (só os italianos apresentam um valor mais baixo). No número de écrans por habitante e nas idas ao cinema, Portugal está também abaixo da média. Em 2007, 31% dos portugueses tinham ido ao cinema no último ano, em comparação com 48% na média da UE.

As preocupações da arte podem não ser as do economista, mas a primeira precisa da segunda e todos os estudos apontam para que a relação seja recíproca.

Qual o valor económico de um língua?

Para o português é 17% do PIB
Um estudo publicado pelo ISCTE em 2008 concluiu que a língua portuguesa tem um valor potencial de 17% do PIB. A análise tem por base actividades económicas em que a língua é um elemento chave, utilizando um modelo usado anteriormente pelo Instituto Cervantes, em Espanha. Segundo estas estimativas, a língua vale 0,5% da riqueza produzida na agricultura e 0,1% na Construção, mas 15% no comércio e 8,7% na indústria transformadora. Outro dos efeitos observados é que as trocas comerciais tendem a ser mais intensas entre países que partilham a mesma língua, existindo também um efeito positivo relacionado com a notoriedade de personalidades, marcas e empresas portuguesas. “É um fenómeno muito parecido com o das telecomunicações, em que também gostamos de utilizar um serviço do operador com maior peso […] porque temos mais pessoas com quem podemos falar”, explicou na altura o investigador José Paulo Esperança, explicando que é por isso que tantos “não falantes” estão a aprender português.

Fonte: Jornal de Negócios



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